Todos nós, revendedores, sabemos que são muitos os problemas que impactam negativamente nossos negócios. Mas um assunto, em particular, tem me tirado o sono há algum tempo: as autuações pordesconformidades que não podem ser detectadas nos postos.
Não há semana que se passe sem que eu tenha conhecimento de algum revendedor honesto que foi multado devido a percentual de biodiesel no diesel diferente dos 5% estabelecidos na legislação, ou por divergências quanto ao pH ou no ponto de fulgor, ou até mesmo por presença de “ciscos” no combustível que não podem ser percebidos a olho nu.
Quem conhece o dia a dia dos postos sabe que é impossível mandar a carreta da distribuidora esperar 12h ou 24h até que o resultado de uma análise laboratorial esteja disponível. A própria distribuidora começará a colocar entraves a esse procedimento (atrasando ou espaçando as entregas), até porque elas mesmas encontram-se com suas logísticas no limite, em meio a uma demanda crescente e à diversificação dos produtos comercializados.
A outra saída para o revendedor é guardar a amostra-testemunha. Procedimento essencial, mas que nem sempre resolve os problemas. Primeiramente, porque há uma dificuldade enorme para quem tem caminhão-próprio conseguir coletar a amostra.
Além disso, mesmo sendo um procedimento previsto e regulamentado pela ANP, nem sempre é aceito pelos órgãos conveniados, incluindo a Secretaria de Fazenda de São Paulo. Justamente lá, onde adulteração implica perda da inscrição estadual. Resta ao revendedor entrar com ação de regresso, o que pode levar anos para sair uma decisão definitiva. Até lá, o posto foi fechado e, para o consumidor, fica a imagem de que aquele estabelecimento estava adulterando.
Durante muitos anos, nós, líderes sindicais, batemos à porta de diversos órgãos em todo o país, pedindo penas mais severas e fiscalizações mais frequentes, de forma a coibir as chamadas máfias dos combustíveis. Felizmente, o mercado depurou-se e apresenta índices de qualidade comparáveis aos de países desenvolvidos.
Isso quer dizer que podemos baixar a guarda, relaxar na fiscalização e afrouxar as penas para quem adultera? Em hipótese alguma. O que precisamos é adequar nossa regulação à nova realidade do mercado.
Chegou a hora de se debruçar com seriedade para discutir o que diferencia uma adulteração de uma não conformidade. O revendedor que vende gasolina com 23% de etanol precisa sofrer uma penalidade, porque está descumprindo a norma estabelecida. Mas não pode ser tratado do mesmo modo de outro que comercializou gasolina com 50% de etanol.
A situação tende a se agravar no próximo ano, quando chega ao mercado o S10. Testes preliminares mostram uma elevada suscetibilidade à contaminação do produto ao longo da cadeia, tornando praticamente impossível chegar ao posto com as 10 partes por milhão de enxofre que saíram da refinaria. A própria Petrobras tem chamado a atenção para esse problema. É verdade que a Europa comercializa S10, mas lá há países com dimensões territoriais ínfimas em relação às do Brasil. Nos Estados Unidos, onde o abastecimento tem desafios logísticos semelhantes ao nosso, optou-se pelo S15. E olha que lá eles contam com uma invejável rede de dutos para transportar combustíveis.
A Fecombustíveis e seus Sindicatos Filiados têm trabalhado fortemente para chamar a atenção das autoridades para esses problemas. Afinal, se nada for feito, poucos serão os postos que sobreviverão no mercado. E, com isso, não perderão apenas os empresários que fecharão suas portas. Perde também a sociedade, que terá menos opções de abastecimento, sentirá uma diminuição da concorrência e uma menor geração de empregos. Uma situação que não interessa a ninguém.
Paulo Miranda é presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e Lubrificantes – Fecombustíveis.